A pedido do querido amigo fotógrafo Hudson Garcia, que está em vias de lançar seu livro sobre a região de Bonito no Mato Grosso do Sul, estou contribuindo com algumas ilustrações que posto aqui:
"A Lenda das 700 Luas"
executado totalmente em caneta esferográfica em papel canson 300g
dimensão 40 x 27 cm
executado totalmente em caneta esferográfica em papel canson 300g
dimensão 40 x 27 cm
"Existiu uma época em que toda a região da Serra da Bodoquena era habitada por um povo admirável. Essa gente especial porque acreditava que o Homem era um ser singular, criado por um DEUS sábio, que colocara em cada um de nós entranhas com muita energia, livre arbítrio e sentimentos constantes. Esse povo formava a brava e poderosa nação TERENA. Livre, soberana e crente em suas tradições.
Entre os valores que cultuavam, um se sobressaia: o AMOR.
Nada era mais importante, nada era mais verdadeiro, nada era mais divino. Fazia parte da cultura acreditar que pelo amor valia a pena viver ou, se necessário, morrer.
Foi devido a essa crença que tudo aconteceu:
...Cacai era a mais bonita de todas as jovens terenas. Ela pertencia a uma tribo localizada próxima a Gruta do Lago Azul, mas guerreiros de todas as tribos já haviam ouvido falar dela e de seus encantos. Havia muitos pretendentes e admiradores.
O jovem cacique daquela tribo resolveu que chegara o momento de arrumar uma companheira. Escolheu Cacai. Seguindo a tradição, convidou-a para o pacto das 700 luas.
O noivo e a noiva faziam um trato de que durante 700 luas iriam se conhecer e em seguida decidiriam quanto às núpcias. A decisão era soberana e livre como cabia a todos os terenas (homem ou mulher).
A negativa era aceita com naturalidade e com respeito por toda a tribo. Se a decisão fosse pelo casamento o pacto era consumado num ritual de amor e fidelidade eterna. O ritual era realizado no interior da Gruta do Lago Azul, onde eram pronunciadas as palavras mágicas que só os velhos terenas conheciam. A decisão era a coisa mais importante na vida de um terena. Não podia haver erro. A união era indissolúvel, nem a morte os separava. Acreditava-se na existência de uma alma imortal.
Transcorria o namoro de Cacai com o jovem chefe da tribo, como era do costume daquela gente, mas o "deus do destino", que coloca os sentimentos no coração das pessoas, tinha outros planos para Cacai.
...Certo dia caiu prisioneiro daquela tribo um guerreiro estrangeiro. Tinha a pele clara e carregava nos olhos um brilho que Cacai jamais vira. Os seus cabelos castanhos apresentavam mechas brancas revelando que aquele guerreiro forte e ágil era quase um ancião. Cacai cuidou de seus ferimentos, ensinou-lhe a sua língua, conquistou a sua alma e... descobriu que ele era o verdadeiro amor de sua vida.
Quando se passaram as 700 luas, a resposta de Cacai foi de que não se casaria com o chefe da tribo. Ele, inconformado e enfurecido, obrigou a realização do ritual, contrariando a sagrada tradição terena.
O pacto foi realizado e, para desespero de Cacai, as palavras mágicas foram pronunciadas. Não havia mais esperanças para Cacai e seu amado. Qualquer mulher que quebrasse o sagrado juramento tinha o seu coração transpassado por uma flecha terena. Cacai sabia disso, mas sabia também que devia obediência ao valor supremo do amor. Curvou-se a ele.
Naquele mesmo dia fugiram numa canoa, descendo o Rio Formoso. O cacique reuniu seus guerreiros e cumpriu-se a maldição. O sangue de Cacai e seu amado foram tornando a água do Formoso cada vez mais limpa e a última gota foi derramada. Todo o rio e até seus afluentes estavam com a água cristalina e transparente como fora o coração de Cacai.
Naqueles dias em que parece que o vento parou e apenas uma leve brisa penetra a solidão e a flor do ipê fica mais colorida.
Quando a água sombria do Lago fica mais azul e se torna alegre com um pássaro solitário que vem refrescar suas penas e cortejar o perfume duma Cacai que nossos olhos não vêem, mas que lá está. Num dia assim tão especial, quando o Poeta vem colher, numa canção, aquela outra messe que os campos produzem. Nesses dias é possível ouvir os sussuros de amor de Cacai e do seu amado imortal.
Quando a água sombria do Lago fica mais azul e se torna alegre com um pássaro solitário que vem refrescar suas penas e cortejar o perfume duma Cacai que nossos olhos não vêem, mas que lá está. Num dia assim tão especial, quando o Poeta vem colher, numa canção, aquela outra messe que os campos produzem. Nesses dias é possível ouvir os sussuros de amor de Cacai e do seu amado imortal.
Está lá no fundo da gruta, está nas cachoeiras, no fundo das águas do rio, está em todo o lugar... é só prestar atenção.
(Autor Desconhecido)"
(Autor Desconhecido)"
"A Lenda do Sinhozinho"
executado totalmente em caneta esferográfica em papel canson 300g
dimensão 40 x 27 cm
"A Lenda do Sinhozinho" - esferográfica sobre papel Artista: Birgitte Tümmler |
"Lenda, realidade e mistério parecem confundir-se quando o assunto é Sinhozinho, figura mítica já incorporada à história e ao folclore de Bonito. Considerado um homem santo por seus seguidores, a história do "Mestre Divino" remete ao ano de 1944, quando este senhor de longas barbas, olhos e cabelos claros apareceu na região.
Sinhozinho era tido como curandeiro e realizador de milagres, utilizando apenas cinzas e água em suas sessões de cura. Vestia um longo manto sob o qual seu braço esquerdo permanecia sempre escondido, sem nunca ter sido visto. Alimentava-se apenas de frutas, mandioca, peixe e mel, do qual carregava sempre um frasco e molhava os lábios constantemente. Não falava, comunicando-se apenas por gestos que fazia para o alto.
Sua mais famosa lenda é a da imensa serpente que vive no subsolo da cidade, e que um dia sairá e acabará com tudo, caso as pessoas não cuidem bem da natureza - alguns interpretam isto como um aviso aos gananciosos, que visam apenas o lucro sem se preocupar com a fragilidade do meio ambiente de Bonito. Durante suas peregrinações pela região, construiu várias cruzes de madeira que deixou fincadas por onde passava.
Por ter arrebanhado inúmeros seguidores, e pelos seus poderes de curar enfermidades, despertou a ira de autoridades e comerciantes de medicamentos, que se tornaram seus inimigos. Foi preso e morto, e diz a lenda que seu corpo foi esquartejado, tendo cada membro jogado em um dos rios da região, o que explicaria a limpidez cristalina de nossas águas.
Até os dias de hoje, em 12 de outubro, ocorrem procissões à Capela do Sinhozinho - localizada próxima ao Rio Mimoso -, onde ainda está guardada uma de suas cruzes, objeto da adoração de seus devotos."